quinta-feira, 28 de outubro de 2010

O ciclo da vida nos video games

Os jogos eletrônicos, como toda forma de entretenimento, buscam frequentemente alguma inspiração na vida real para construir suas experiências de jogo. Desde os mais simples, como Pong, até os mais complexos, como os RPGs épicos, muitos games aproveitam aspectos da vida humana em seus sistemas.

Para exemplificar mais claramente, personagens evoluem com o tempo e conforme adquirem experiência em determinadas áreas, agem com emoções diferentes quando encontram situações variadas... Em alguns casos vemos até animais falando e se comportando como seres humanos, em metáforas direcionadas à forma como interagimos.

Img_normal

Se existe um elemento, no entanto, que quase nunca é representado nos games, é o ciclo completo da vida. Já vimos personagens que passam de jovens a adultos (como em Ocarina of Time), heróis ressuscitados que transcendem a humanidade e se tornam deuses (como em God of War), transição de um personagem a outro como forma de continuar as aventuras (como em Torchlight)...

Mas ver alguém nascer, crescer, atingir seu ápice, envelhecer e depois morrer... Isso é retratado por pouquíssimos títulos — o mais famoso, e talvez único realmente grande, é The Sims. E o faz pois acompanhar a vida cotidiana de um personagem virtual é o foco principal do jogo.

Será que é tão difícil incorporar isso aos games para tornar as experiências de jogo mais ricas e realistas? Sem, é claro, acabar frustrando o jogador por ter seu personagem tão querido descartado — ou o oposto, sem fazer com que o jogador deixe de se identificar com ele pois sabe que eventualmente deverá abandoná-lo?

Por quê?Quais as razões para incluir tal sistema?

Como qualquer elemento incluído em jogos eletrônicos, a primeira pergunta a ser feita quando pensamos na viabilidade de um ciclo da vida dentro de um game é: isso vai agregar alguma coisa à experiência de jogo? Não adianta nada bolar todo um sistema perfeitamente realista se ele não vai ser aproveitado — ou se não fará diferença alguma para o usuário final. Assim, podemos pensar em algumas razões para a existência de tal elemento nos games:

  • Maior realismo para os personagens;
  • História mais envolvente;
  • Variedade de estilos de jogo graças às mudanças dos personagens;
  • Sentimento de continuidade por parte do usuário;
  • Possibilidade de incluir várias aventuras em uma mesma história mais abrangente.

Img_normalEssa lista é arbitrária, obviamente, e elaborada por nós mesmos do Baixaki Jogos com base em nossas experiências. Mas ao conversar com jogadores e ler sobre o assunto é possível verificar algo simples, mas importante: um ciclo da vida só faria sentido dentro de um game que explorasse bastante seus personagens. Pong, que citamos previamente, não quer nem saber de algo desse tipo.

Assim, não basta olhar para os pontos positivos de um sistema como esse e simplesmente afirmar que os jogos eletrônicos deveriam tentar implementá-lo — é preciso perceber quais os títulos que se beneficiariam de algo do gênero, e como iriam utilizá-lo. Portanto, antes de passarmos aos pontos negativos, vamos conferir as limitações que se apresentam.

Os limitesNem tudo é para todos

Este artigo já está se tornando bastante abstrato, então vamos rumar de volta à realidade, por meio da análise de um game específico — ou, nesse caso, uma franquia. O sistema de ciclo da vida de The Sims se encaixa perfeitamente na proposta do título e, coincidentemente ou não, preenche todas as razões elencadas no tópico anterior:

A experiência se torna mais realista, a história ganha em riqueza, o estilo de jogo muda conforme o personagem envelhece, existe uma continuidade e as aventuras são tantas que é possível jogar por tempo indeterminado.

Com tudo isso em mente, quais são os limites para a implementação do sistema? Quais são os jogos que mais se beneficiariam, e que nível de profundidade ele deveria exibir para se integrar totalmente ao resto dos elementos de jogo? É possível inseri-lo sem torná-lo a peça central da jogabilidade?

Img_normal

Logo de início, podemos imaginar que games de RPG poderiam facilmente receber um sistema como esse. Além deles, as campanhas dos títulos de tiro e ação poderiam incorporá-lo, desde que de forma mais abrangente — até mesmo Solid Snake ficou velho, então já existem precedentes. Mas um jogo em particular vem à mente como sendo o candidato perfeito: Heavy Rain.

Por que ele? Porque o objetivo da desenvolvedora é contar uma história de maneira interativa, fazendo que o jogador participe no desenrolar dos eventos — eventos esses que se dão em um espaço relativamente curto de tempo, mas que poderiam ser apenas parte de algo muito maior. Imagine poder rever, em games subsequentes da franquia, personagens dos títulos anteriores mas com o passar dos anos sobre as costas!

Já os RPGs podem aproveitar o sistema de maneira mais convencional, especialmente aqueles que acompanham as aventuras de um só protagonista. Ao contar a história do personagem, o título poderia explorar sua vida desde a o nascimento, passando pela infância e juventude nas quais ele aprende a encarar o mundo, para depois atingir o ápice na fase adulta, chegando enfim à velhice na qual as aventuras são de outra natureza.

É claro que nem todo game quer fazer isso, mas a possibilidade realmente existe, contanto que exista um esforço genuíno dos desenvolvedores para enriquecer consideravelmente os personagens presentes no jogo.

Os problemasOs obstáculos que surgem ao tentar

Como de costume, no entanto, falar é fácil. Dizer que existem muitos pontos positivos leva apenas alguns segundos — torná-los realidade, no entanto, leva muitos mais. Além da necessidade de uma história para suportar um eventual sistema de ciclo de vida, é preciso um grande trabalho em cima do personagem em si: código, animações, texturas, arte conceitual, modelagem... Por isso, existe também uma lista de pontos negativos:

  • Esforço tremendo em um aspecto secundário do jogo;
  • Possibilidade de frustração do jogador ao ter que abandonar seu personagem;
  • Desinteresse do usuário uma vez que o personagem comece a perder vigor;
  • É preciso levar em consideração todos os envolvidos na trama, não só o protagonista;
  • Incompatibilidade de mortes acidentais com uma experiência de jogo.

Este último é, talvez, um dos mais importantes — mas também o que é negligenciado em todos os games que já implementam um sistema como esse. Em The Sims, por exemplo, seu personagem não pode ter um infarto fulminante e morrer. Ou contrair câncer e precisar de sessões constantes de quimioterapia.

Isso se dá pela extrema frustração que causaria no jogador caso eventos como esse acontecessem. Imagine cuidar de seu adorado personagem por dezenas de horas, planejando o futuro e o progresso de sua carreira, apenas para ter uma surpresa ao iniciar a partida em uma noite: seu personagem faleceu aos 35 anos, de morte súbita. Como diria a internet... Nerd Rage!

Img_normal

Logo, é possível perceber que os pontos negativos devem ser levados igualmente em consideração — e que podem ser tão importantes que acabam desencorajando o desenvolvimento de um sistema de ciclo da vida dentro de um jogo, como podemos verificar atualmente.

Mas se existem pontos positivos e negativos, o que sobra? O que é realmente prático e poderia ser usado sem que houvesse muito gasto de recursos? Ao entrelaçar o lado bom e o ruim, podemos chegar a algumas conclusões.

As variáveisO que ajuda e o que só atrapalha

Em primeiro lugar, a continuidade é algo que poderia ser aplicado nos games. Frequentemente, vemos franquias que trocam de protagonista quando o primeiro já não serve mais, quando atinge certos objetivos na vida ou quando sua posição não o permite desempenhar as mesmas ações que o tornaram famoso anteriormente.

Isso também possui um ponto diametralmente oposto: personagens que ficam parados para sempre no tempo, para que suas aventuras tenham sempre o mesmo estilo e agradem aos fãs — algo que não é ruim, mas que não é necessário para certas marcas.

Por outro lado, eventos aleatórios são quase que inteiramente descartáveis, com a exceção de alguns jogos específicos. Ninguém quer que seu personagem morra pois um motorista bêbado atravessou o sinal vermelho e o atropelou a 100 km/h. Imagine se, ao jogar GTA, um caminhão de lixo esmagasse seu carro contra a parede e fosse necessário reiniciar do zero...

De volta ao lado bom, a utilização de aventuras pequenas que se sucedem e variam em estilo conforme o personagem amadurece também é algo fácil de ser implementado. Um protagonista de 20 anos em um jogo de espionagem pode estar sendo treinado em determinada porção do game, enquanto aos 30 anos ele já está atuando em campo, para aos 50 estar administrando as operações da agência e negociando políticas.

Seja como for, ainda existe um bom espaço de design ainda não explorado pela grande maioria dos desenvolvedores de jogos no que diz respeito ao ciclo da vida nos video games. Enquanto não vemos algo de concreto nos grandes blockbusters, podemos especular... Qual é o jogo que você mais gostaria de ver com um sistema como esse?

Nenhum comentário:

Postar um comentário